Temporada 2024
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PRAÇA JÚLIO PRESTES, Nº 16
01218 020 | SÃO PAULO - SP
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SEG A SEX – DAS 9h ÀS 18h
22
abr 2017
sábado 16h30 Imbuia
Temporada Osesp: Treviño e Budu


Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo
Robert Treviño regente
Cristian Budu piano


Programação
Sujeita a
Alterações
Wolfgang A. MOZART
Rondó para Piano e Orquestra em Lá maior, KV 386
Francisco MIGNONE
Burlesca e Toccata
Dmitri SHOSTAKOVICH
Sinfonia nº 4 em Dó Menor, Op.43
INGRESSOS
  Entre R$ 46,00 e R$ 213,00
  SÁBADO 22/ABR/2017 16h30
Sala São Paulo
São Paulo-SP - Brasil
Notas de Programa

MOZART

Rondó Para Piano e Orquestra em Lá Maior, KV 386


A justaposição entre sequências virtuosísticas ao piano e passagens transparentes, de fácil assimilação, era um dos segredos do sucesso dos concertos que Mozart compunha e interpretava em seus primeiros anos em Viena. Atento às reações da audiência, o compositor procurava esse justo ponto de equilíbrio em que a riqueza das tramas de sua arquitetura musical não fosse um obstáculo para a fruição da peça. A essa época, no início dos anos 1780, ainda eram incomuns iniciativas como esta, de tentar se emancipar como músico autônomo. (1)


Alguns pesquisadores acreditam que o Rondó para Piano e Orquestra em Lá Maior tenha sido originalmente composto como uma alternativa para o “Finale” do Concerto nº 12, na mesma tonalidade, escrito em 1782. Mas há argumentos que justificam também a ideia de uma peça avulsa, breve, em estilo concertante. O manuscrito vendido em 1799 por Constanze, viúva de Mozart, não continha as últimas páginas, que só foram localizadas em 1980 pelo musicólogo inglês Alan Tyson. Como é característico na forma rondó, a peça baseia-se em um tema principal (nas cordas, logo na abertura), que é retomado sempre, depois de ser contrastado por outros temas de caráter diverso. E é nesse jogo de diálogos, sugestões e complementaridades entre o piano e a orquestra que se faz a narrativa musical.

 

 

MIGNONE

Burlesca e Toccata

 

Cerca de 150 anos depois da composição do Rondó de Mozart, o desafio de encontrar este ponto convergente na criação artística, em que o acirramento das invenções não provoca um distanciamento do público, continuava inquietando os compositores, também no âmbito da música de concerto no Brasil. “Minha música deverá ser, dia a dia, mais refinada como técnica, mas clara, franca, facilmente compreensível para a maioria”, escreveu Francisco Mignone em 1947, ao completar 50 anos. (2)


Mignone teve uma sólida formação fundamentada nas práticas da música europeia do século XIX. A partir dos anos 1930 passou a se dedicar intensamente à exploração de ritmos populares, produzindo uma série de peças que constituiriam sua chamada “fase negra”. Na década seguinte, por influência de seu amigo Mário de Andrade, entende a necessidade de se afastar dessa vertente, que a princípio lhe abrira inúmeras fronteiras, mas que no momento o cerceava. “Mário compreendia, sentia, admirava Mignone com alma e carinho, mas também com lúcida isenção”, diria Manoel Bandeira (3) em 1955.


Burlesca e Toccata, de 1958, pode ser entendida como fruto dessa crise que impulsionou Mignone para uma terceira fase, estilisticamente ponderada e mais madura. Em forma de concerto, mas com o piano sempre presente, a peça é bastante virtuosística para o solista e timbristicamente brilhante para a orquestra. Aqui a brasilidade não é explícita, mas acha-se introjetada de maneira orgânica no tecido musical, envolvida nos agregados sonoros mais contemporâneos. Ouvem-se, aqui e ali, ataques de Stravinsky, gestos de Liszt, sutilezas de Debussy e amálgamas de Bartók. Mas afinal, como diria com certa ironia o próprio compositor, “ninguém é inteiramente pessoal”.

 


SHOSTAKOVICH

Sinfônia nº 4 em Dó Menor, Op.43

 

Para entender o conjunto das sinfonias de Shostakovich faz-se necessário considerar a relevância dos acontecimentos históricos a que o compositor esteve sujeito, que viriam a influenciar diretamente a formação de sua personalidade musical. Esse percurso atormentado e controverso foi escrito em meio aos enfrentamentos e recuos do dia a dia, durante décadas, como reflexo imediato da intensidade das pressões, ora claramente explícitas, ora sombriamente veladas, do regime stalinista.


Em 1937 Shostakovich havia composto dois movimentos da Sinfonia nº 4, quando uma suposta desaprovação de Stálin à sua ópera Lady Macbeth do Distrito de Mtsensk (1936) provocou o editorial “Confusão em Vez de Música” no Pravda (jornal oficial do partido comunista). Como detalha Alex Ross, a Filarmônica de Leningrado já ensaiava para a estreia quando o próprio autor desistiu da apresentação, entendendo que a complexidade da peça poderia ser tomada como uma perigosa provocação em resposta ao editorial: “todos estavam com medo”, teria dito o compositor.


É possível ouvir na Quarta de Shostakovich uma conversa de superfície com a Sexta de Mahler (ouvida na segunda semana desta Temporada). Mas há também, nas camadas mais profundas, elementos especialmente particulares em sua partitura, como o embate entre processos narrativos em constante transformação e momentos de estase, em que o próprio tempo musical parece girar em falso. Escrita para uma orquestra monumental (cerca de 130 integrantes) a Sinfonia nº 4 do compositor russo só estrearia em 1962, quase dez anos depois da morte de Stálin.

 

SERGIO MOLINA é compositor, Doutor em Música pela USP, coordenador da Pós-Graduação em Canção Popular na FASM (SP) e professor de Composição no ICG/UEPA de Belém.

 

1. A transição na função do músico, de seu ofício como artesão a serviço da nobreza para a figura do artista autônomo, é tratada por Norbert Elias em Mozart, Sociologia de um Gênio (Rio de Janeiro: Zahar, 1995).

2. ANDRADE, Mario de. “A Parte do Anjo” (1947). Artigo sobre Mignone reproduzido em MARIZ, Vasco (org.). Francisco Mignone – o Homem e a Obra. Rio de Janeiro: Editora da UERJ, 1997.
3. Palestra realizada por Manuel Bandeira (1955) reproduzida em MARIZ, Vasco (org.). Francisco Mignone – o Homem e a Obra. Rio de Janeiro: Editora da UERJ, 1997.

4. ROSS, Alex. “A Música na Rússia de Stálin”. In: O Resto É Ruído. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. Ross dedica a esse tema quase 50 páginas do livro.


Leia sobre Dmitri Shostakovich no ensaio "Shostakovich: o Ruído do Tempo ", de Julian Barnes, aqui.