CHIN
Concerto Para Violino / COMPOSITORA EM RESIDÊNCIA
Em seu ensaio reproduzido na Revista Osesp 2017, o musicólogo Hanno Ehrler mostra como a compositora sul-coreana (radicada na Alemanha) Unsuk Chin [1961] tem sido bastante requisitada, ao longo das últimas duas décadas, tanto no ambiente da música orquestral quanto no da música de câmara, — e mesmo não se alinhando diretamente às escolas mais conhecidas da invenção contemporânea. Sua atuação como compositora em residência, não apenas este ano com a Osesp, mas também na Casa da Música do Porto e no prestigiado Festival de Lucerna — onde a estreia de Le Silence Des Sirènes teve a regência de Simon Rattle —, comprova essa tese.
Sua escrita é extremamente minuciosa e precisa, e revela, nas entrelinhas, uma apropriação de determinadas técnicas de György Ligeti, seu principal mestre. Mas isso não se traduz em uma música que ecoa o estilo do compositor húngaro. Pelo contrário, baseada em formas clássicas e estruturas sólidas, a música de Chin ocupa um espaço bastante particular na cena atual da música de concerto.
Isso pode ser notado em seu Concerto Para Violino, a primeira peça de Unsuk Chin a ser interpretada pela Osesp nesta temporada. Ainda que organizada em uma narrativa de quatro movimentos — com início, meio e fim —, é possível ouvi-la também como um processo contínuo, em que as sonoridades moldadas vão se transformando a partir de combinações inusitadas que a compositora cria com os naipes da orquestra. Nesse sentido, o próprio violino, que raramente propõe melodias na concepção usual, pode ser entendido como mais um entre muitos elementos. Se no plano mais amplo o som flui em ondas de diferentes densidades, no âmbito do violino solo há uma exploração radical de suas potencialidades: harmônicos, pizzicati, glissandos e efeitos de percussão.
Composto em 2002, o Concerto Para Violino de Chin foi originalmente estreado e gravado pelo maestro Kent Nagano e a Orquestra Sinfônica Alemã de Berlim, com Viviane Hagner ao violino.
SERGIO MOLINA é compositor, Doutor em Música pela USP,
coordenador da Pós-Graduação em Canção Popular na FASM (SP)
e professor de Composição no ICG/UEPA de Belém.
FAURÉ
Requiém, Op.48
Desde logo, Fauré respondeu às críticas de que seu Réquiem foi alvo: “Dizem que não expressa bem o terror diante da morte. Alguém o apelidou berceuse da morte. Mas é assim mesmo que eu a concebo: uma venturosa libertação, uma aspiração à felicidade do mundo, e não uma experiência dolorosa”. Coerente com sua ideia, o compositor incluiu um Pie Jesu e a antífona In Paradisum como último movimento da obra, proporcionando assim uma antevisão do Paraíso e um fim apaziguador.
Supõe-se que o falecimento de seus pais tenha sido a razão impulsionadora da música, iniciada em 1887. Fauré começou seu trabalho neste projeto ao compor um Réquiem em cinco movimentos para o coro da Igreja de La Madeleine de Paris, do qual era diretor. A instrumentação era pequena e previa apenas as cordas da orquestra (sem violinos), harpa, tímpanos e órgão. Em seguida, acrescentou o Offertorium e o Libera me — com seu famosíssimo solo de barítono — e, em 1898, ampliou a orquestração. A première oficial do Réquiem, Op.48, ocorreu em 12 de julho de 1900, no Trocadero de Paris.
A despeito do acima exposto, a música não é isenta de sombras. Logo no início, o Introitus e o Kyrie exibem a dor da perda recente e o desvanecimento que se segue. O coro oferece momentos particularmente eloquentes quando canta o Réquiem Aeternam.
Seguindo uma rica tradição da composição ocidental, em que sempre foi importante a relação da palavra com a música, Fauré procura imprimir à sua peça cada inflexão dramática do texto, alcançando, ao lançar mão desse recurso, um outro nível de sugestão sinestésica, próprio das grandes obras de arte: surgem imagens sonoras...
[...]
O In Paradisum, para melhor evocar a voz dos anjos, é eventualmente (como nesses concertos) interpretado com coro infantil no lugar dos sopranos e contraltos. Este último movimento é o acolhimento final da alma e é interessante notar como uma troca simples do foco expressivo — antes contrito, agora confortador — é capaz de marcar o jeito costumeiro de pensar e abordar um gênero tão consagrado quanto a Missa de Réquiem.
O compositor e professor Osvaldo Lacerda [1927-2011] costumava dizer que o exemplar de Fauré constitui um marco na extensa história da música sacra, visto ter oferecido outra interpretação ao velho conjunto de poemas litúrgicos. Lacerda complementava dizendo: “É a antevisão do paraíso...”. [2003]
ANTONIO RIBEIRO
é compositor, assessor pedagógico
do Conservatório de Tatuí
e coordenador artístico
da Escola Municipal de Música.
I. RÉQUIEM
Concede-lhes o descanso eterno, ó Senhor,
e que a luz perpétua os ilumine,
Um hino agora te convém, ó Deus em Sião,
e que a ti seja rendida homenagem em Jerusalém.
Ouve a minha prece,
diante de ti comparecerá toda carne.
Senhor, tende piedade de nós.
Cristo, tende piedade de nós.
II. OFERTÓRIO
Ó Senhor Jesus Cristo, Rei da glória,
liberta as almas de todos os fiéis mortos
das penas do inferno
e do abismo profundo.
Liberta-as das garras do leão,
para que o Tártaro não as engula,
para que não caiam na escuridão.
Sacrifícios e preces a ti, Senhor,
oferecemos em louvor.
Aceita-os em favor dessas almas,
das quais hoje nos lembramos.
Permite, ó Senhor,
que elas passem da morte para a vida,
como outrora prometestes a Abraão
e a seus descendentes.
III. SANTO
Santo Senhor Deus dos Exércitos,
o céu e a terra estão repletos com a tua glória.
Hosana nas alturas!
IV. Ó, PIO JESUS
Ó, Pio Jesus, Senhor,
conceda-lhes o descanso.
O descanso eterno.
V. CORDEIRO DE DEUS
Cordeiro de Deus,
que tiras o pecado do mundo,
concede-lhes o descanso.
Concede-lhes o descanso eterno, ó Senhor,
e que a luz perpétua os ilumine,
eternamente entre teus santos,
pois tu és misericordioso.
VI. LIVRA-ME
Livra-me, Senhor, da morte eterna,
naquele terrível dia,
quando os céus e a terra se moverem,
quando tu vieres julgar os séculos pelo fogo.
Já tremo e temo,
quando o abalo e a ira vierem.
Dia de ira, aquele dia,
de calamidade e de miséria,
um dia grande e muito amargo.
Concede-lhes o descanso eterno, ó Senhor,
e que a luz perpétua os ilumine.
VII. AO PARAÍSO
Que os anjos lhe conduzam ao paraíso,
Que os mártires te recebam na tua chegada.
E te introduzam na santa cidade de Jerusalém.
Que o coro dos anjos te receba,
e com Lázaro, outrora um pobre,
tu também tenhas um descanso eterno.
Leia o ensaio “Unsuk Chin: Ordem, Caos e Computadores”, de Hanno Ehrler, aqui.